por Douglas Eden, Guin ga
Geralmente, ao findarmos algum trabalho, resta algum material que não foi aplicado. Alguns o doam, ou jogam fora, por falta de espaço ou de imaginação; outros o guardam para utilização futura.
O mesmo ocorre na criação do haicai, ou no desenvolvolver do kasen: alguns versos imperfeitos, ou desprovidos de kigô; outros não apropriados ao estágio em que se desenvolve o kasen, ou mal sintonizados à estação do ano determinada, têm como destino o cesto do lixo.
Haicai e Kasen são gêneros poéticos aparentados entre si Pode-se dizer que o haicai que conhecemos hoje seja um subproduto do Kasen. Kigô é um termo da Natureza que se refere à estação do ano em que estamos escrevendo o haicai. Pode ser uma flor, uma planta, uma atividade humana própria da estação do ano em que se está, ao escrever o haicai.
Goga dizia que o haicai pertence ao momento em que o sentimento é expresso ao aflorar de uma sensação. A expressão desse sentimento emoldura-se nos três versos da tradição do haicai no Ocidente, ou nos 17 sons da tradição japonesa. Mas Goga dizia mais: dizia que passado esse momento ao qual o haicai é pertinente, o tanzaku torna-se um papelzinho inútil (tanzaku é o papel em que se escreve o haikai). Mas tão inútil como aqueles que os samurais enviados às côrtes dos reis de Espanha e ao Vaticano jogavam no lixo, após limparem o nariz, na valeta central das acanhadas ruas medievais, para espanto e curiosidade dos citadinos europeus do pós-Renascimento.
Não discordando da essência desse ponto de vista de nosso Mestre, dado o pesado lastro cultural em que se apoia, mas sinto de modo diferente: vejo beleza também nas pontas, nas aparas, limalhas e outrs sobras de algum trabalho, físico, material ou intelectual.
Dizem os cristãos que Deus, ao terminar a construção do mundo, colocou no Maine - pequeno estado à Nordeste dos EUA, lindeiro ao Atlântico Norte - as sobras do material que Ele usou.
O litoral do Maine e dos estados ao sul, até o Cabo Cod, é um dos mais pitorescos do mundo. Da pequena Nantucket partiam, no séulo XIX, os navios de caça à baleia, em longínquos Cruzeiros que abrangiam as mais altas latitudes alcançadas pelo Atlântico e pelo Pacífico. Demandando o norte deste último, alcançaram o Japão, em busca de pontos de apoio para abastecimento e reparos. Foram as necessidades destes pequenos navios, na passagem da navegação à vela para a navegaçãoa vapor, que forçaram a abertura do Japão para as nações do Ocidente, concretizada pelo Comodoro Perry com seus "navios negros". Após ela, caiu o último xogum Tokugawa, e restaurou-se o poder do Imperador, que comprendeu a conveniência em adaptar aos novos tempos. Instituiu a educação pública e o serviço militar obrigatórios. Modernizou a indústria e os transportes, e dotou seu Exército e sua Marinha de navios e armamentos produzidos no próprio país. Uma pequena fração dessa História foi mostrada no filme "O último samurai".
O mesmo ocorre na criação do haicai, ou no desenvolvolver do kasen: alguns versos imperfeitos, ou desprovidos de kigô; outros não apropriados ao estágio em que se desenvolve o kasen, ou mal sintonizados à estação do ano determinada, têm como destino o cesto do lixo.
Haicai e Kasen são gêneros poéticos aparentados entre si Pode-se dizer que o haicai que conhecemos hoje seja um subproduto do Kasen. Kigô é um termo da Natureza que se refere à estação do ano em que estamos escrevendo o haicai. Pode ser uma flor, uma planta, uma atividade humana própria da estação do ano em que se está, ao escrever o haicai.
Goga dizia que o haicai pertence ao momento em que o sentimento é expresso ao aflorar de uma sensação. A expressão desse sentimento emoldura-se nos três versos da tradição do haicai no Ocidente, ou nos 17 sons da tradição japonesa. Mas Goga dizia mais: dizia que passado esse momento ao qual o haicai é pertinente, o tanzaku torna-se um papelzinho inútil (tanzaku é o papel em que se escreve o haikai). Mas tão inútil como aqueles que os samurais enviados às côrtes dos reis de Espanha e ao Vaticano jogavam no lixo, após limparem o nariz, na valeta central das acanhadas ruas medievais, para espanto e curiosidade dos citadinos europeus do pós-Renascimento.
Não discordando da essência desse ponto de vista de nosso Mestre, dado o pesado lastro cultural em que se apoia, mas sinto de modo diferente: vejo beleza também nas pontas, nas aparas, limalhas e outrs sobras de algum trabalho, físico, material ou intelectual.
Dizem os cristãos que Deus, ao terminar a construção do mundo, colocou no Maine - pequeno estado à Nordeste dos EUA, lindeiro ao Atlântico Norte - as sobras do material que Ele usou.
O litoral do Maine e dos estados ao sul, até o Cabo Cod, é um dos mais pitorescos do mundo. Da pequena Nantucket partiam, no séulo XIX, os navios de caça à baleia, em longínquos Cruzeiros que abrangiam as mais altas latitudes alcançadas pelo Atlântico e pelo Pacífico. Demandando o norte deste último, alcançaram o Japão, em busca de pontos de apoio para abastecimento e reparos. Foram as necessidades destes pequenos navios, na passagem da navegação à vela para a navegaçãoa vapor, que forçaram a abertura do Japão para as nações do Ocidente, concretizada pelo Comodoro Perry com seus "navios negros". Após ela, caiu o último xogum Tokugawa, e restaurou-se o poder do Imperador, que comprendeu a conveniência em adaptar aos novos tempos. Instituiu a educação pública e o serviço militar obrigatórios. Modernizou a indústria e os transportes, e dotou seu Exército e sua Marinha de navios e armamentos produzidos no próprio país. Uma pequena fração dessa História foi mostrada no filme "O último samurai".
Abaixo, vou largando a amarra, por seções:
Seção 1:
O velho gaucho
devagar, remenda o poncho...
Sopra o minuano.
Um zunido entre os galhos
das árvores desfolhadas...
O homem curvado
passa lento, tendo à brida
um cavalo baio ...
Seção 2:
(Festival das Flores, comemorado
Manhã do Hanamatsuri -- ... na primavera, na Liberdade)
o monge , alegre , sorri ...
Abrindo o desfile
um grupo de escoteiros
puxa o elefante branco...
As poucas nuvens de chuva
se dispersam pelo céu ...
Seção 3:
Noite paulistana - -
Na Vinte-e-Três de Maio
os fluxos vermelho e branco.
Bem debaixo do viaduto
um grupinho bebe pinga.
Na festa do Ivan
dança-se até as cinco horas...
Vizinhos reclamam.
Seção 4:
O tempo esfriou muito súbito:
quase tive um choque térmico!
Seus braços morenos,
seus longos cabelos negros
envolvem-me em sonhos...
No dia seguinte, a manchete:
Apanhou da Namorada!
Guin Ga
A amarra é uma extensão de corrente bem grossa e pesada, dividida em seções de cores diferentes, que faz a âncora fixar-se ao fundo do mar com segurança, evitando que o navio seja levado pelas ondas ou por alguma correnteza, à matroca.
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Gostei, Capitão. Um texto e poemas de múltiplas referências que se lê como quem está no tombadilho de um navio em alto mar: deliciosamente à matroca.
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