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Revista de Haicai - Editores: Chris Herrmann e Jiddu Saldanha
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quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Sansushi
Celso Pestana

O pequeno “Sansushi” ainda estava vazio. Numa mesa lá atrás, um homem vigiava a entrada, como quem espera por alguém. Quando se certificou de quem éramos, abriu um sorriso e veio nos cumprimentar, mostrando o efeito que lhe causou o bigode e o cavanhaque que venho cultivando:

– Pestana? Mas você parece o Leminski!


Benedita Azevedo, Jiddu Saldanha e Celso Pestana

Jiddu Saldanha, ao vivo e a cores, tem o mesmo jeitão a que nos habituamos na internet: afável, bom de papo, sempre mostrando entusiasmo ao falar de atividades culturais, tanto as suas como as alheias. Sobre a mesa em que nos convidou a sentar, o masu e o rashi sobre uma travessa com sinais de sushi dividiam o espaço com uma pilha de livros, todos sobre haikai e tanka, que ele fazia questão de mostrar, um por um, a quem ia chegando: Saigyô, Masao Ohno, Leminski, Alice Ruiz, Benedita Azevedo...

Benedita Azevedo com sua filha e Tizuko Shiraiwa ao fundo

Benedita, aliás, chegou tarde, mas transformou o evento numa noite de autógrafos do seu mais novo livro, “Rumor das Ondas” - José Marins, seu editor, vai acabar tendo uma estafa.



Benedita Azevedo autografando

Tizuko, a simpaticíssima dona do restaurante - e, a meu ver, uma dessas pessoas especiais - veio jantar conosco, animando mais ainda o bate-papo - comentários sobre os livros, sobre esse ou aquele poeta, sobre o Butoh que víamos na TV, etc. -, fazendo da nossa mesa o “centro nervoso” do evento.


Tizuko Shiraiwa, proprietária do restaurante Sansushi, em santa tereza/RJ.
Apaixonada pela literatura nipo-brasileira,em especial, a poesia


Só quando o Jiddu exibiu o cine-haiga “Haigatos”, tive uma decepção: embora o meu terceto abra o clipe, Dada, minha mui amada esposa, achou o haigato do Tchello d’ Barros mais bonito. Mas nem esse desgosto tornará a noite menos memorável.


Jiddu Saldanha, Celso Pestana e sua esposa Graça

Valeu, Jiddu. Valeu, Tizuko.

Viveiro de pássaros -
O tico-tico almoça
Sem ser convidado.

Benedita Azevedo

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segunda-feira, 27 de setembro de 2010




IMPRESSÃO DE LEITURA
Jiddu Saldanha


Poemas da Cabana Montanhesa
-Saigyo-
Tradução: Nissin Cohen
Editora Hedra

Tenho em mãos um belo livro de tankas do poeta japonês Saigyo Hoshi, “Poemas da Cabana Montanhesa” um presente do meu amigo José Martim Estefanon do Museu do Imigrante da cidade de Bento Gonçalves/RS. Um presente inesperado que encheu meu coração de amor e me fez navegar pelo mar desconhecido por mim, da poesia clássica do Japão.

Durante a leitura deparei-me com momentos de grande prazer existencial, como quando estava no avião voltando ao Rio de Janeiro e li quase em deleite este belo poema:


Espaço vazio rodeado
Por penedos, tão longe
Que aqui estou todo sozinho:
Um lugar onde ninguém pode me ver
Mas eu posso todas as coisas rever:

[Saigyo – Tradução: Nissin Kohen]

O livro é uma realização da editora Hedra e merece toda a atenção do leitor, porque além de ser bonito (para aqueles que apreciam livros também como objeto) e com ótimas notas sobre a história do Japão medieval; nos remete a imagens muito claras e profundas sobre o mundo e o contexto histórico em que o poeta viveu.

Recentemente, no restaurante Sansushi, no belíssimo bairro de Santa Tereza /RJ, enquanto conversávamos sobre literatura japonesa, citei Saigyo e, entre os amigos presentes, pude sentir a curiosidade de todos enquanto manuseavam o livro, tanto que o poeta Celso Pestana até sugeriu que eu fizesse uma resenha para a revista Nosso Haikai.

Embora eu não tenha nenhuma pretensão de me tornar um “resenhador” de livros, deixo a você, caro leitor da Nosso Haikai, uma provocação para que conheça o livro deste monumental poeta japonês cuja obra atravessou o tempo e chegou até nós com sabor de eternidade.

Sagyo nasceu em Kyoto 1118 e morreu em Osaka 1190. Seu nome é um pseudônimo (ou “nome poético” como é de costume entre poetas japoneses) de Sato Norikiyo. Ele pertenceu a uma casta de samurais do clã Fujiwara e seu pai fora um oficial da guarda dos portões do palácio imperial.

O poeta seguiu a vida militar e quando ia completar 23 anos, resolveu, por razões inexplicadas, trilhar o caminho da poesia. Viveu 72 anos e é festejado até hoje como um dos grandes nomes da poesia japonesa de todos os tempos.

Rasteando-se no vento,
A fumaça do Monte Fuji
Dissolve-se no céu.
Assim também meus pensamentos –
Seu lugar-de-repouso é desconhecido.

[Saigyo – Tradução: Nissin Kohen]

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domingo, 26 de setembro de 2010

Dois dias para não mais esquecermos
Jiddu Saldanha

Foi uma ótima experiência estar no restaurante Sansushi nos dias 24 e 25 de Setembro de 2010, no bairro de Santa Tereza, RJ e compartilhar com as pessoas que estiveram lá aquele dia tão especial para a leitura e troca de idéias sobre Haicai, Haigas, Haibuns e tankas. Foi um momento especial que nos uniu e nos transformou através de uma prática onde escrever por si só, não basta. O haicai é uma poesia sentida, vivida e transpirada na labuta da existência.


Um papo sobre poesia japonesa, espiritualidade, não faltou sensação de alegria e tranquilidade.

Lá estiveram os poetas Celso Pestana, Benedita Azevedo, Gracia Levine, o fotógrafo Rodrigo Méxas além da forte presença espiritual de Monja Zen que, de forma muito generosa abriu nossa sensibilidade para uma reflexão sobre a real presença do zen muito além das especulações cotidianas.

Também esteve conosco a querida poeta Mônica Terra com seu tom xamânico e irreverente, chamando para o contato e o encantamento através da literatura. Tivemos uma ótima recepção do grupo de funcionários da casa: Claudinho, o gerente, deu lições de arte com sua forma bonita de declamar e a Jaqueline que servia com grande competência suculentos sushis, sahsimis,etc... não sem apreciar a beleza da poesia japonesa. Não podemos deixar de marcar a presença da bela “afrojapa” paulistana Bianca, professora de moda que nos brindou com sua presença e curiosidade em conhecer melhor a poesia que seus avós trouxeram para o Brasil.

Não podemos deixar de agradecer a querida parceira de haiga, Alexandra Arakawa que foi quem disparou a idéia e o conceito do projeto palimpsesto. A dona da casa que nos recebeu tão bem foi a queridíssima Tizuko Shiraiwa que além de conhecer e amar a literatura japonesa, no mostrou belas obras de sua coleção pessoal e presenteou a revista Nosso Haikai com livro da Sra. Geny Wakisaka, sobre o Man’ yôshû; um estudo sobre a antologia japonesa organizada no século VII e XIII, dando uma ótima noção dos primórdios da poesia naquele país. Tizuko também nos apresentou à obra do poeta Tokuboku Ishikawa (1885 – 1912) contemporâneo do poeta modernista japonês Masaoka Shiki (1865 – 1902).

Agora, estamos nos preparando para reeditar o recital Poesia na Quarta Capa, que ganhará espaço no restaurante Sansushi, com sua volta prevista para o dia 20 de outubro deste ano, num ousado formato onde juntaremos a poesia ocidental e oriental. Aguardem.

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sábado, 25 de setembro de 2010



Cine Haiga "PALIMPSESTO"


[clique na imagem para vê-la em tamanho natural]

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segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Os Passos do Tanka
por Rosa Clement

História

Tanka, é um termo de origem japonesa que significa "poema pequeno e elegante". Evoluiu a partir do waka, um tipo de poesia japonesa, escrito por nobres e aristocratas da corte Heian centrada em Kyoto durante o século XII. O waka refletia os tempos, lugares, pessoas, sociedades e vidas dos seus autores. No incio de 1900, o waka passou a ser chamado de tanka por reformadores como Tekkan Yosano, Yosano Akiko, Masaoka Shiki, e outros, sendo tanka, portanto, um termo relativamente novo. Conhecido como waka até aquele período, foi a forma de poesia do Japão praticada por mil anos e ainda hoje é bastante popular. O tanka foi uma das principais formas usadas para transmitir mensagens de amor, desejo e gratidão de um amante para outro.

Os primeiros tanka foram publicados no século oito, A.D., na Antologia Manyoshu, a primeira grande antologia de poesia japonesa, e em seguida na antologia Kokinshu, publicada no século 10, usando estruturas muito popular na época. Aqui está um exemplo (versão traduzida por mim) por Kakinomoto Hitomaro, o mais famoso poeta do Manyoshu, mostrada na estrutura que conhecemos:

the autumn wind
has become cooler now;
horses abreast
let´s go to the meadow
to see the hagi blooms

o vento de outono
tornou-se mais frio agora;
cavalos lado a lado
vamos para o campo
olhar as flores de hagi (um pequeno tubérculo com flores pequenas e rosadas)

Masaoka Shiki tentou modernizar o tanka também assim como fez com o haiku, isto é, preferia escrevê-las de forma mais simples e menos romântica do que os tankas do Manyoshu. Inclusive, ele deu um título a este poema, coisa que nunca foi necessária no tanka.

The Tea

crowding night
weary with the work
of writing things
blew the fire to life
and drank some tea

O Chá

passando a noite
cansado com o trabalho
de escrever coisas
soprei o fogo para a vida

e bebi um pouco de chá

Yosano Akiko, uma das grandes expressões do período romântico na virada do século, não hesitou em quebrar o tabu ao escrever poemas mais sensuais:

You have yet to touch
This soft flesh,
This throbbing blood --
Are you not lonely,
Expounder of the Way?

Você precisa tocar
Esta carne macia,
Este sangue pulsando --
Você não está só,
Expositor do Caminho?

No ocidente há diversos escritores de tanka, entre eles, destacamos o grupo americano que pratica o tanka há alguns anos. Aqui está um tanka de um de seus principais praticantes Michael McClintock:

leading my horse
to the river at midnight
scattered stars
in such impossible numbers
we don't mind drinking a few

levando o meu cavalo
para o rio à meia-noite
estrelas espalhadas
com tais números impossíveis
não importa se bebemos um pouco

Enfim, há muitos escritores de tanka que deixamos de mencionar.


Definição

Tanka é um poema composto de cinco linhas, geralmente sem rima. A forma mais frequentemente citada é com 5, 7, 5, 7, 7 sílabas em cada linha, resultando em um comprimento total de 31 sílabas para o poema. Alguns seguem essa forma estritamente. A forma mais solta do tanka é o truncamento do comprimento de 31 sílabas de modo que uma, várias ou todas as cinco linhas são mais curtos do que os seus comprimentos formalmente prescritos. É essencial que as cinco frases sejam coerentes, não apenas uma lista e integradas em um poema unificado. A quinta linha deve ser a mais forte.


Conteúdo

Tanka difere de outros gêneros da poesia japonesa tanto em forma como em conteúdo. Pode ser um poema lírico já que foi a forma para expressar não somente louvor sobre amor impossível entre os amantes, mas também perda, saudade, e aspectos semelhantes da nossa vida emocional. Pode fazer uma ligação entre alguns aspecto da natureza e alguns aspectos da vivência humana, geralmente, as emoções. O assunto ou estilo de tanka não precisa ser limitado a esses. Muitos estilos e temas ainda não foram explorados em tanka, mas deveriam ser. Um exemplo é a crítica social que certamente pode funcionar muito bem sob a forma tanka.

Como o haiku, o tanka não tem título, rimas no final da linha, palavras capitalizadas, ponto final e faz uso de pouca pontuação. Pode ter mas não é necesssário: linha pivô ou zeugma, mudança de visão durante o poema, pausa após qualquer linha, encadeamento (emjambment), analogia entre natureza e natureza humana, metáforas, símiles, personificações e pode ainda contar apenas o meio de uma história, não a história completa. A maioria dos tanka é escrita na primeira pessoa.

Um tanka pode ser escrito basicamente como um haiku para as linhas 1, 2, 3, que trata de um assunto natural e, em seguida, mais duas linhas que pode lidar com uma experiência humana de forma que tenha ressonância metafórica, simbólica, ou outra com o haiku.

Linha pivô ou zeugma, geralmente a linha 3, é uma característica do tanka que pode estar ou não presente. A linha pivô pode ser lida com a linha 1 e 2 , e também com as linhas 4 e 5, uma propriedade que pode ser usada para introduzir ambigüidade e ressonância no poema.


Conclusão

Escrever tanka não é somente colocar juntos dois haiku. Tanka é um tipo de poesia própria para expressar não apenas os sentimentos de amor, mas também outros sentimentos como você mesmo pode descobrir. No tanka há uma troca de tempo, pessoa, voz, etc. com a finalide de criar uma nova relação.

O texto acima é uma breve introdução ao tanka e como tal, oferece apenas um apanhado geral para quem deseja começar a escrever tanka de imediato. No entanto, há muito mais para conhecer, aprender e praticar.


Bibliografia


* Garrison, Denis M.. Tanka Teachers Guide. USA.2007. ww.modernenglishtankapress.com
* Higginson, William. J. The Haiku Handbook. Kodansha International. 1985.
* Reichhold, Jane. Writing and Enjoying Haiku : A Hands-on Guide. US: Oxford
University Press, 2002.

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SÉRGIO PICHORIM


Sérgio Francisco Pichorim (23/4/1965) é natural de São José dos Pinhais, Paraná. Engenheiro Eletricista, mestre e doutor em ciências (MSc e DSc). Casado e pai de duas filhas, é professor da UTFPR (departamento de eletrônica).
Chegou ao universo do haicai seguindo as trilhas abertas pelo teólogo Leonardo Boff (de quem ouviu falar pela 1ª vez de Matsuo Basho) e por Rabindranath Tagore e pela poetisa paranaense Helena Kolody (com quem conheceu o haicai).
Na passagem de 1999 para 2000 conheceu a revista eletrônica Caqui de haicais (www.kakinet.com) e começou a participar da lista de discussão de haicai em português (haikai-l do yahoogrupos.com.br).
Participou do 14º Encontro Brasileiro de Haicai, realizado em Campinas no ano de 2002, onde foi contemplado com o 1º lugar no Grande Desafio (concurso de haicai).
Blog: Fieira de Haicais




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